Em Castelo Viegas, a Sopa da Noiva.

“Pelos casamentos, a Chanfana é que era o prato mais esperado. A minha mãe tinha dois fornos, um maior para fazer a chanfana, o outro mais pequeno era para cozer a broa. Punha a lenha no forno e fazia uma fogueira em condições, aquele forno levava oito caçoilas de Chanfana. No fundo da caçoila, punha uma cabeça de alho inteira e duas folhas de loiro com as pontas tiradas, só depois se metia a carne partida, o sal, o piripiri, o colorau e o vinho tinto, tinha de ser do bom. Não levava mais nada, porque a cabra já larga gordura. Ficava aquelas horas no forno, estava ali devagarinho a cozer lentamente. Às vezes, até deixava a carne dentro do forno durante a noite, apurava devagarinho, mas não podia ficar lá brasa nenhuma. A minha mãe usava tapar as caçoilas com uns testos. Depois, na segunda feira dos casamentos, a minha mãe, com o molho da chanfana, fazia sempre este prato, era a Sopa da Noiva. À parte cozia hortaliça. Depois, punha o molho com os bocadinhos da carne a ferver e, quando estivesse apurado, juntava-lhe a hortaliça já cozida e, por cima, punha pão de trigo. Punha mais um bocadinho de molho e repetia as camadas. Ficava um pouco no lume a ferver e a apurar. Aquilo era muito bom.”

Memória Oral

Outrora, em Castelo Viegas, um Casamento durava vários dias. Entre a preparação da boda e a celebração da cerimónia, era necessário assegurar que o momento era devidamente assinalado, quer pela nova família que se iria constituir, quer pela comunidade que iria testemunhar o enlace. Por isso, as travessas de Arroz-Doce tinham de ser entregues aos amigos e vizinhos, ritual preparatório de uma fecundidade que se desejava. Mas, era a boda que ocupava mais tempo e dava mais trabalho às cozinheiras. De véspera, os fornos enchiam-se de caçoilas de Chanfana, pois que era necessário assegurar que o tempo que passavam no forno era o suficiente para a deixar apuradinha e bem assada. A azáfama na cozinha passava por arranjar e prever alimento, rico e saboroso, para todas as refeições da boda. Era, por isso, que na segunda-feira dos casamentos a Sopa da Noiva regalava quando chegava à mesa. Era ainda um resquício do tempero suculento da Chanfana, criação de um povo que soube sempre, até ao limite, tirar partido, da arte culinária.

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